16 de jan. de 2011

Entrevista com Alice Ruiz

Alice Ruiz, a autora que contribuiu enormemente para a popularização do haicai em nosso país, nos deu impressões valiosas sobre poesia nessa conversa exclusiva para o blog do
Poemas no Ônibus e no Trem. Além de estarmos contando com uma artista de repercussão nacional, afiada com a poesia contemporânea e com informações arejadas sobre o gênero, vale lembrar que o Haicai, gênero que Alice tornou-se referência, é um dos mais praticados nas inscrições para o Concurso Poemas no Ônibus e no Trem. Toda edição, algum haicai acaba sendo selecionado ao longo da trajatória do concurso. Alice Ruiz nos brindou com suas considerações generosas sobre o gênero e so-bre criação. Alice Ruiz começou a escrever com apenas 9 anos de idade. Com 26 publica em revistas e jornais culturais, mas só lança seu primeiro livro,Navalhanaliga, em 1980. Seu primeiro Jabuti de Poesia veio em 1989 com o livro Vice versos. Além de escritora,Alice já compôs teve mais de 50 músicas gravadas por parceiros e intérpretes e gravou o CD Paralelas, em parceria com Alzira Espíndola, com as participações e especiais de Zélia Duncan e Arnaldo Antunes. Autora de 19 livros, seu mais re-cente livro,Dois em um, venceu o Prêmio Jabuti na categoria poe-sia em 2009.

Existe um tema central na poesia de Alice Ruiz? ou todo tema cabe em sua poesia desde que lhe faça sentido?

Quando se trata de haikai, o tema é sempre a natureza, para seguir o modelo niponico. Quando acontece um terceto sobre a natureza humana, prefiro chama-lo assim: terceto. Na letra de música, onde tenho também um compromisso de que seja poética, é mais comum que o tema seja a natureza humana, com ênfase nos relacionamentos. Até porque é uma forma de conversar mais de perto com o ouvinte, seduzi-lo de imediato. Já a poesia ela mesma, no sentido ocidental, permite uma gama bem maior de temas e assuntos.

Comente sobre o Poema no Ônibus e no Trem enquanto projeto que leva a poesia para os transportes públicos. Em sua opinão, qual o grande mérito desse projeto?

Difícil achar um mérito único. São muitas as qualidades desse projeto. Oferecer um outro olhar para a realidade. Chamar para a reflexão. Tirar do marasmo do cotidiano. Atrair para a poesia aqueles que, por um motivo ou outro, não a usufruem. Apresentar novos autores para os que já tem o hábito dessa leitura. Colocar beleza no dia a dia.

O haicai, gênero em que você contribiui para qualificar e popularizar no Brasil, e que concentra boa parte da sua produção, é um dos mais produzidos para o Poemas no Ônibus, muito pela sua brevidade e graça. Como você analisa o interesse pelo gênero e seu poder de atração que desperta em leitores e autores?

A letra, diferente do poema para ser lido, pede métrica mais rígida, rimas mais frequentes, incidência das tônicas e, principalmente, coloquialidade. Creio que essas são as principais diferenças. Quanto às semelhanças, a letra pede tanta verdade, elaboração e criação de linguagem, quanto o poema escrito.

Fale sobre a concepção e projeto do belo livro Hai Tropikais, desde o formato (cartão), projeto gráfico, até a parceria da autoria.

Não poderia, a concepção e edição foi do Guilherme Mansur, poeta de Ouro Preto. Foi dele a iniciativa de selecionar alguns haikais meus e do Paulo Leminski e publicá-los nesse volume. Inclusive o título é dele. Nós a recebemos como um presente.

A poesia no mercado editorial é sempre complexa, na sua opinião a poesia deve cada vez mais sair do livro e ganhar outros suportes? você acha que isso pode gerar um número de leitores mais expressivo?

A poesia já migrou para vários suportes. Na música, por exemplo, temos no Brasil a melhor canção do mundo, provavelmente porque nossa canção conta com letras altamente poéticas, além é claro, de compositores musicais inspiradíssimos. E a poesia mais sintética já está no out-door, nos muros, nas camisetas, no vídeo texto, na holografia, na internet. Parece mesmo perfeita para as novas tecnologias. E quanto mais suportes tivermos, melhor será. Quem sabe até possa a vir alterar o comportamento do mercado editorial. Ouço desde menina que a poesia está morrendo, e a sinto e vejo cada vez mais viva.

Duas ou três dicas na hora de escrever o poema que Alice Ruiz considera fundamentais.

Creio que isso está respondido na pergunta quatro. Verdade, elaboração de linguagem, formas novas de dizer o já conhecido, mas também de dizer o novo. Familiaridade com a linguagem e para isso ler muita poesia, teorias sobre poesia, e mesmo prosas que acrescentem conhecimento e idéias poéticas. Universalidade, isto é, falar do que é comum a (e sobre) um maior número de pessoas. Só que tudo isso é feito antes. Na hora de escrever o poema, o ideal é já ter assimilado de tal forma esses fatores, para que o poema nasça espontâneo. Para que a intenção de faze-lo não apareça.



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